Simone Tebet diz que a reeleição de Bolsonaro é ameaça à democracia

Míriam Leitão

GLOBONEWS

A senadora Simone Tebet (MDB-MS), lançada pré-candidata à Presidência, em entrevista exclusiva que me concedeu na Globonews, fez um resgate do MDB histórico, da luta pela democracia e posicionou sua pré-candidatura claramente como de oposição. Simone Tebet disse que no governo Bolsonaro a democracia está sob ataque o tempo todo e que a reeleição dele é um risco para a democracia. “O MDB tem experiência nesse combate. Estamos de prontidão. Somos soldados da democracia.” Ela reconheceu o legado bom do governo do ex-presidente Lula, mas disse que o país precisa olhar para a frente. E, mesmo avisando não estar falando de Sergio Moro, alertou que para governar o Brasil é preciso ter experiência administrativa. Abaixo os principais trechos:

– Senadora, o MDB poucas vezes disputou a Presidência, preferiu ser o partido pivô de coalizões. Nas vezes que disputou, não foi muito bem. Por que a senhora decidiu concorrer agora?

Simone Tebet – É preciso entender o papel do MDB numa democracia como o Brasil. As democracias no mundo só são fortes quando têm um grande partido de centro, que consegue dialogar mais à esquerda, mais à direita e construir consensos. Desde a redemocratização o MDB foi isso, abrigou todas as correntes ideológicas. Nós somos municipalistas, temos capilaridade, e preferimos, depois da redemocratização, ser esse partido que dá estabilidade política para que o presidente, seja ele de que partido fosse, pudesse desempenhar bem o seu mandato. O que aconteceu agora é que nós sentimos, diante de tantos retrocessos, de direitos humanos, às minorias, ao pensamento crítico, à imprensa, à oposição, ameaça às instituições democráticas, que não era possível ficar calado. O MDB, então, fez uma mudança radical. Primeiro, se tornou um partido independente, nomeou um presidente novo, e principalmente rompeu com o que não concordamos, lançando uma candidatura própria à presidente. O campo democrático não tem outra alternativa.

– A senhora falou muito da questão democrática em seu discurso, nesse momento a sua opinião é que a democracia está sob ataque?

Simone – O tempo todo. O ataque é silencioso, por isso é difícil convencer a pessoa que não está inteirada do que se passa, ou o jovem que não viveu a ditadura, do perigo que é a reeleição do atual presidente da República. As instituições vão sendo atacadas através de redes sociais, através de fake news, através da narrativa mentirosa na fala da autoridade máxima do país. Ele ataca a própria imprensa, que é fundamental para a democracia, a oposição, ele nega a ciência, a tecnologia. No momento em que o Brasil mais precisou de um governo forte, acolhedor, que protegesse, que salvasse, nós temos um total desgoverno. O governo que aí está não conhece o Brasil, não conhece as nossas mazelas, as nossas desigualdades, não conhece as nossas riquezas porque as destrói e tenta reescrever a história. O MDB tem experiência nesse combate. Estamos de prontidão. Somos soldados da democracia, porque sem ela, nós não temos liberdade, igualdade de oportunidades, não podemos avançar.

– A senhora é a única mulher nesta corrida. Quando algumas pessoas disseram que a candidatura era apenas para se posicionar para ser vice, o presidente do partido, Baleia Rossi, disse que era preconceito. A senhora sente assim também?

Simone – Eu só posso dizer que eu não tenho plano B, o MDB não tem Plano B, pelo menos não comigo. Quando me chamaram para ser pré-candidata, sentimos que havia um clamor da base, dos municípios. Relutei muito, mas num momento tão difícil, com tanta fome, é preciso a voz de uma mulher. Eu sou pré-candidata a Presidência da República. O MDB tem história, tem projeto, tem capilaridade, já ajudou a governar, já governou bem e agora tem essa preocupação com o futuro.

– O MDB é muito dividido. Inclusive tem grupos com o presidente Bolsonaro. Como a senhora pretende unir o partido?

Simone – É natural, o maior partido do Brasil que sempre pregou a pluralidade tem divergências. É natural. Mas vamos estar em todos os palanques regionais. Uma candidatura à Presidência é também regionalizada, nós queremos fazer o maior número de deputados estaduais, deputados federais, governadores, senadores. Nosso bloco vai pra rua. Acredito que o momento que o Brasil vive não aceita que as nossas divergências sejam maiores do que as nossas convergências.

– A senhora disse que não será o economista da campanha o primeiro nome a ser anunciado. Por que não, se estamos numa crise econômica?

Simone – Estamos numa crise porque o governo perdeu o rumo, o norte, não sabe para onde vai, não tem plano de desenvolvimento. Aplica o dinheiro que tem para comprar votos e aprovar projetos também equivocados. Quando tem reformas faz de um jeito que liberais como eu não conseguem votar, como a reforma administrativa e a tributária. O que ele queria era aprovar uma CPMF disfarçada. O investidor não precisa ter dúvidas sobre o meu posicionamento na economia, a minha história fala por mim. A responsabilidade social depende da responsabilidade fiscal. Precisamos de um ambiente seguro econômica, social e ambientalmente falando para atrair o capital estrangeiro e nacional.

– Parte do MDB é do agronegócio que tem, em certa parte, uma agenda muito atrasada do ponto de vista ambiental, mas seu estado, o Mato Grosso do Sul, é muito vulnerável nessa área. Como conciliar?

Simone – Um país que tem a solução climática para o mundo não pode deixar de ser protagonista nesta história. A Amazônia é nossa, mas isso traz para nós uma grande responsabilidade. Eu impedi que houvesse usinas de álcool no Pantanal e só conseguimos isso porque ali havia o homem pantaneiro. Eu venho do agronegócio sério, que é sustentável, está inovando com tecnologias para diminuir o gás metano.

– No lançamento falou-se muito de diversidade, mas a política é dominada por homens brancos. Como tornar esse discurso realidade?

Simone – Você tem razão. Temos um senador negro, pouquíssimas deputadas federais e estaduais negras. As mulheres são minoria na representação, imagina as mulheres negras. Precisamos de políticas públicas para as minorias como um todo.

– A senhora fez o discurso sem papel, de improviso, mesmo nesse momento de emoção. Por quê?

Simone – Eu nasci dentro do MDB. Quando eu tinha cinco anos meu pai foi prefeito e não parou. A minha vida sempre foi pública e dentro do MDB. Eu conheço a história do partido, conheço o projeto do partido. O MDB sempre teve a bandeira da justiça social. Resume tudo o que queremos. Inclusão digital tem que ser um direito de cada brasileiro, eu disse isso. Meu pai sempre dizia, fale com o coração que você não vai errar. Eu estava na minha casa.

– O seu pai, senador Ramez Tebet, foi muito citado durante a cerimônia. Ele foi do MDB histórico, da raiz, o que ele te diria nesse momento?

Simone – Tão difícil falar isso sem me emocionar. Se eu faço política é por causa dele, homens públicos como ele. Ele me diria, sem dúvida nenhuma, salve o Brasil. E ele estaria dizendo não só para mim, mas para todos os democratas, no MDB ou fora dele. Temos que fazer um pacto. Não é possível a gente retroceder. O fruto desse desgoverno é a insegurança até do investidor, por isso o dólar subiu. Uma parte da crise foi por causa da pandemia, mas o nosso caso foi pior. Nós temos hoje inflação, desigualdade social crescente, número recorde de desempregados porque o governo não teve a capacidade sequer de pacificar o Brasil. E dar segurança para quem investe. Ele diria para todos os democratas, está na hora de salvar o Brasil.

– A CPI fez um grande trabalho, mas a senhora não tem medo de esse trabalho morrer na praia pela atuação do procurador-geral da República?

Simone – A CPI conseguiu pôr vacina no braço dos brasileiros. Poderíamos ter passado de 700 mil ou 800 mil mortos. A CPI mostrou o que é esse governo. Ele pregou a bandeira da ética, mas sabia e soube que havia um núcleo, uma parte do núcleo militar inclusive, fazendo transações escusas dentro do Ministério, faturando vacina à custa da dor das pessoas e da morte, ele teve conhecimento e não tomou providência. A Justiça será feita. O presidente da República não vai ser eternamente presidente da República, uma hora ele vai sair do Planalto e responder na Justiça comum ou quando tivermos outro procurador. Eu temo sim, com esse procurador, eu não espero grandes coisas, a não ser se for uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

– O ex-presidente Lula governou com o apoio do MDB e agora ele é o favorito nesta campanha. Qual a sua opinião sobre ele?

Simone – O tempo do PT e do presidente Lula já passou. Ele deixou um grande legado, mas cometeu um erro que foi o motivo desse processo todo na Justiça, quando numa reeleição ele se entregou como faz o atual presidente. Não estou comparando, mas está na hora de olhar para a frente. O centro democrático tem que apresentar uma alternativa. O Brasil não pode ter apenas o passado, com tudo o que representou de bom e ruim, e esse presente por tudo o que representa de ruim.

– A senhora disse que o momento não era de outsiders. Estava se referindo a Sergio Moro?

Simone – Estava me referindo ao atual presidente, para mim ele é um aventureiro. Mas sim, acho que neste momento é preciso levar em conta experiência administrativa. Não é fácil governar o país vindo de fora. Aceitei pela experiência que tenho, senão diria não dou conta do recado.

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