Talita Duvanel
Autor de “O mundo de Sofia”, o escritor norueguês Jostein Gaarder, de 68 anos, não esquece as perguntas infantis, mas profundamente filosóficas, que fazia aos pais e professores quando era criança em Oslo, cidade onde nasceu e mora até hoje.

Gaarder estudou Filosofia e Teologia e se tornou professor de uma escola secundária. Em paralelo, escrevia livros de ficção desde 1986, mas apenas em 1991 lançou a obra que o levaria ao rol dos autores mais comentados da década.

— Foi meu quarto livro, mas somente com ele parei de lecionar — diz o norueguês, pai de dois filhos e avô de cinco netos.

O GLOBO: Quando o senhor escreveu “O mundo de Sofia”, qual era o maior objetivo? Tinha em mente atingir tantos adultos?

JOSTEIN GAARDER: Queria alcançar jovens e também adultos, os dois públicos, escrevendo sobre filosofia ocidental de um jeito fácil. E todas as pessoas fazem perguntas filosóficas. Penso que hoje, durante a pandemia, muita gente está se perguntando sobre o que é mais importante na vida.

Como a filosofia pode nos ajudar a enfrentar esses tempos?

Ela pode nos ser útil em combater a desinformação?

A filosofia sempre lutou contra as fake news, porque sempre está procurando a verdade real. O que há de mais profundo em nossos estudos é a busca pela verdade. Lá no início, com os primeiros filósofos gregos, o que havia era a constante procura pela verdade lógica, quebrar conceitos mitológicos. No mundo contemporâneo, isso equivale ao que Donald Trump gosta de dizer: verdades alternativas. O que é um conceito ridículo. Todos nós tentamos interpretá-la, chegamos a resultados diferentes, mas nossa busca é pela verdade única, não há alternativa.

Capa da primeira edição em português de 'O mundo de Sofia' Foto: DivulgaçãoCapa da primeira edição em português de ‘O mundo de Sofia’ Foto: Divulgação

O senhor faria alguma mudança no livro hoje ?

Com certeza, duas. Primeiramente, não imaginava que ele seria lido na China, no Japão, na Índia. Teria escrito sobre filosofia oriental ou enfatizaria no título que era um livro sobre o pensamento ocidental. Outra coisa: falaria mais sobre ecologia e meio ambiente. Algumas questões filosóficas são as mesmas, como “o que é o Universo”, “se Deus existe”. Mas há novos questionamentos. O mais importante hoje em dia é: como podemos assegurar a vida na Terra no futuro?

A personagem Sofia, se real, estaria com 44 anos. Como imagina que ela seria depois daquelas aulas?

Minha Sofia estaria mais preparada para viver neste mundo, mas não muito engajada na questão ambiental, em como preservar a vida na Terra. Eu era um pouco ignorante nisso quando escrevi o livro, apesar de mencionar rapidamente o assunto. Deveria ter abordado mais a nossa responsabilidade com o planeta.

O senhor é muito ligado a esse assunto e disse, numa entrevista ao GLOBO, em 1998, estar bastante preocupado com o futuro da Amazônia. Tem acompanhado a política do governo brasileiro para a região?

Não sei muito sobre especificidades, mas acho que Bolsonaro não tem feito o melhor que pode, na visão do meu país. Ele nega os relatórios de preservação. Há uma preocupação muito grande aqui. Mas a responsabilidade ambiental na Noruega também é enorme, com a exploração que fazemos do petróleo.

Poderia nos adiantar seus próximos projetos literários?

Estou escrevendo, pela primeira vez, um livro de não ficção, sobre o mundo em que estamos vivendo.