‘Por que Lady Gaga é exemplo de genialidade e Michael Phelps, não’: o que os gênios têm em comum, segundo professor de Yale
Ludwig van Beethoven tinha problemas para somar e nunca aprendeu a multiplicar ou dividir. Pablo Picasso não sabia o alfabeto, Walt Disney adormecia na sala de aula e Virgina Woolf não tinha permissão para ir à escola, apesar de seus irmãos terem sido mandados para a prestigiosa Universidade de Cambridge.
Charles Darwin estava indo tão mal na escola que seu pai até disse que ele seria um constrangimento para a família e Albert Einstein se formou em física em quarto lugar em sua geração… de um total de cinco alunos.
Cada um deles não estaria à altura dos padrões acadêmicos de hoje e, ainda assim, todos entraram para a história por sua genialidade nas artes ou na ciência. Mesmo muitos dos gênios de hoje –como Bill Gates, Bob Dylan ou Oprah Winfrey– abandonaram a escola e ainda assim alcançaram sucesso e reconhecimento em suas respectivas áreas.
Wright acaba de publicar o livro “The Hidden Habits of Genius: Beyond Talent, IQ, and Grit—Unlocking the Secrets of Greatness” (“Os Hábitos Ocultos dos Gênios—Além do talento, QI e coragem, revelando os segredos da grandeza”), no qual detalha 14 traços que os gênios têm em comum.
Acontece que essa lista não inclui outras características usualmente associadas às conquistas excepcionais da humanidade, como possuir um enorme talento. A definição de gênio varia de acordo com “a quem você pergunta e quando”, reconhece Wright.
Segundo o especialista, “um gênio é uma pessoa com extraordinários poderes mentais cujas obras ou conceitos originais mudam a sociedade de uma maneira significativa para melhor ou para pior em todas as culturas e ao longo do tempo”.
Ele até desenvolveu uma “fórmula de gênio”: G = S x N x D. Ou seja, gênio (G) é igual a quão significativo (S) é seu impacto ou mudança, multiplicado pelo número (N) de pessoas impactadas e por sua duração (D) no tempo.
Em outras palavras, para Wright, os maiores gênios são aqueles que causam o maior impacto sobre a maioria das pessoas e por mais tempo.
Nos anos em que lecionou o chamado “curso de gênio” na Universidade de Yale (Estados Unidos), Wright viu os alunos franzirem a testa ao ouvi-lo dizer que a cantora pop Lady Gaga é um exemplo contemporâneo de gênio ou que o atleta com mais medalhas olímpicas da história, o nadador Michael Phelps, não.
Ele também testemunhou seus alunos levantarem a mão quando foram questionados no primeiro dia de aula se gostariam de ser gênios. No fim do curso, no entanto, apenas muito poucos continuaram a expressar tal desejo.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
A palavra “gênio” é definida nos dicionários como quem possui “extraordinária capacidade mental de criar ou inventar coisas novas e admiráveis”. O que o sr. acha disso?
Acho que é uma definição limitada. É o que eu chamaria de “gênio potencial”, porque tem potencial para se tornar um gênio, mas ainda não é. Os dicionaristas que escreveram essa definição estão dizendo que tudo que você precisa fazer é ser capaz de usar seu cérebro para criar ideias originais, incluindo o criador que mantém a ideia para si mesmo.
Isso é algo que podemos discutir e, para tanto, gostaria de invocar a imagem de um Albert Einstein sozinho em uma ilha abandonada. Estando lá poderia ocorrer a ele que E = mc², ele poderia conceber a teoria da relatividade geral e assim por diante, mas não conseguiria comunicar suas ideias a ninguém e, portanto, nunca ouviríamos falar de Albert Einstein.
Pela definição que encontramos nos dicionários, Einstein ainda seria um gênio. Pela minha definição, não, porque não teria impacto em ninguém no mundo. Então, isso é algo que abre uma espécie de debate filosófico.
Como, então, o sr. definiria um gênio?
Como explico em meu livro, o QI é superestimado. Testes de QI padronizados são uma forma de medir uma habilidade particular que é herdada em grande parte. Ao estudar esses grandes indivíduos ao longo dos séculos, você pode ver que eles eram inteligentes, mas não teriam necessariamente alcançado um resultado superalto –digamos, 140 ou 150– em um teste de QI.
Nesse sentido, costumo usar os vencedores do Prêmio Nobel como exemplo de referência: houve premiados com QIs de 115, 120 ou qualquer outro. Em outras palavras, você precisa de um QI acima da média para entrar no jogo. Mas há uma série de outros fatores e motivações que estão, no longo prazo, realmente impulsionando alguém para a grandeza e dando-lhe a capacidade de mudar o mundo.
Acabei de passar cinco dias gloriosos com três adolescentes de 16, 14 e quase 13 anos. Todos têm notas muito boas e estão estudando para essas provas; o objetivo é poder entrar nas melhores instituições de ensino. Aí falei para eles que talvez as notas não fossem tão importantes, que deveriam sair para explorar o mundo, fazer atividades diferentes, errar, cair e ter que se levantar…
Mas seus pais –meu filho e sua esposa– me disseram que eu estava transmitindo a meus netos a mensagem errada, que o objetivo deles era apenas encorajá-los a tirar boas notas. Então, agora os pais me veem como uma má influência (risos). Mas a verdade é que penso que hoje se exerce demasiada pressão sobre os jovens, pois os critérios que utilizamos para medir a sua excelência como pessoas estão errados.
O que as pessoas deveriam fazer para criar filhos gênios ou se tornar um?
Acho que o mais importante é o esforço, mas o que faz você trabalhar duro? Porque na verdade o esforço não é um motor em si mesmo, mas a manifestação externa de outras motivações internas. A paixão é um motor que se manifesta como um trabalho árduo e que pode ir do amor a algo à obsessão.Então, diria que é importante estimular as paixões.
A outra coisa que notei em muitas dessas grandes mentes é que elas são estudiosas, que sabem sobre diferentes áreas. Num dos capítulos do meu livro, falo sobre a fábula da raposa e do porco-espinho: a raposa sabe muito sobre coisas diferentes e o porco-espinho, muito sobre apenas uma coisa.
Então, que tipo de pessoa você é: alguém que sabe muito de tudo ou muito de um pouco? A maioria dessas pessoas, de uma forma ou de outra, têm o chamado pensamento lateral. Elas vêem coisas diferentes ao mesmo tempo porque tiveram várias experiências e, como resultado, podem combinar elementos diferentes que outras pessoas não conseguiam porque são aparentemente diferentes.
Portanto, se você está criando filhos, é importante expô-los a diferentes experiências: se eles gostam de ciência, você pode encorajá-los a ler romances; caso se interessem por política, talvez possam aprender a pintar.
Os pais que forçam seus filhos a se concentrar em uma atividade para ser o melhor nadador olímpico ou o próximo Prêmio Nobel de Física estão errando. Não saberemos qual é a sua paixão, a menos que tenham experiências diferentes.E, como diz o ditado, se você ama o que faz, não terá que trabalhar um único dia de sua vida.
Quem são exemplos de gênios contemporâneos de acordo com sua definição e quais tendem a surpreender mais seus alunos?
Existem vários, mas Elon Musk é o gênio arquetípico que faz coisas aparentemente malucas e em uma diversidade de áreas com a The Boring Company, Hyperloop, SolarCity, Tesla, SpaceX…É o exemplo definitivo do estudioso fazendo uma revolução de várias maneiras diferentes.
Mas quem são alguns dos gênios inesperados? Se eu menciono, por exemplo, Kanye West, Lady Gaga ou Dolly Parton, alguém vai balançar a cabeça em negação e me perguntar se estou brincando. Dolly Parton é um caso muito interessante porque é uma pessoa muito inteligente que, ironicamente, adotou a imagem de “loira burra”. É uma espécie de cavalo de Tróia.
Ela construiu seu próprio império e continua a fazê-lo. Ela é um modelo de como uma mulher de negócios deve atuar no mundo do entretenimento hoje. E, ao mesmo tempo, nos encanta por compor certos tipos de canções e trazer o som country para as correntes musicais mais populares.
Portanto, é possível dizer que Dolly Parton é de enorme importância, principalmente para as mulheres brancas pobres na América, e que seu impacto é significativo em relação ao número de pessoas que ouvem sua música. Resta saber quanto tempo isso vai durar.
Depois, há casos como Michael Phelps. Quer dizer, alguém na França reinstituiu as Olimpíadas da Grécia antiga e apenas disse quais esportes incluiriam e um deles era natação. Aí ficou estabelecido que iriam competir no estilo livre, costas, peito e borboleta, nos 100 metros, 200 metros e tudo mais. Michael entra na piscina e descobre que está indo e voltando na mesma pista muito mais rápido do que todos os outros.
Mas alguém vai conseguir eventualmente nadar mais rápido do que ele, porque há uma seleção de tipos de corpo que são necessários, porque a nutrição está melhorando e talvez o treinamento também esteja se aprimorando.
Mas os dicionaristas têm razão: aqui não há componente intelectual. É quase como um hamster em uma gaiola indo cada vez mais rápido. Gosto de pensar que ser um gênio é mais do que ser um hamster em uma gaiola ou um nadador em uma piscina.
Por que o sr. acha que a maioria dos seus alunos de Yale, depois de estudar esses gênios, não querem mais ser como eles?
O problema com essas grandes mentes é que muitas vezes são muito destrutivas para os que as cercam, porque são tão apaixonadas que se tornam obsessivas. A única coisa em que podem se concentrar é em alcançar seu próprio objetivo mental, porque acreditam que vão mudar o mundo. Elas acham que precisam consertar algo e que só elas podem fazer isso.
São pessoas muito ambiciosas que colocam muita pressão sobre si mesmas e, às vezes, sobre os outros. Elas podem se tornar muito exigentes com os outros e subestimá-los. Portanto, pode não ser agradável trabalhar para esses gênios. São coisas que você pode ouvir sobre Jeff Bezos, Elon Musk ou Bill Gates, por exemplo.
Então, acredito que a maioria das pessoas, ao passar pelo curso de gênio, se pergunta: “Realmente quero ser assim? Quero mudar o mundo para um grande número de pessoas ou quero que o ambiente humano ao meu redor seja o melhor para todos?”
E esse é realmente o tema mais profundo por trás de seu livro também…
O segredo do meu livro é que a maioria de nós não vai mudar o mundo de nenhuma maneira significativa. No entanto, aprender sobre o que essas pessoas fizeram nos leva a pensar em coisas mais importantes nas quais todos podemos agir: como viver nossas vidas em relação às outras pessoas, como ser mais produtivos ou mais criativos.
Porque os gênios já estão obcecados com o que fazem e vão decolar de qualquer maneira. Enquanto isso, o restante de nós tem a oportunidade de pensar sobre como queremos viver e ajustar nossas vidas com base nisso.