Desde o começo da pandemia, há pouco mais de um ano, o jornalista Álvaro Pereira Jr. vem se dedicando à cobertura do assunto. Seu trabalho já pôde ser visto, por exemplo, em diversas reportagens exibidas no “Fantástico”. Mas a partir de hoje, o público vai poder conferir o resultado de um capítulo desafiador encarado por Álvaro nessa jornada ainda sem ponto final.

‘Cercados’Documentário mostra o trabalho da imprensa na cobertura da pandemia

Em “A corrida das vacinas”, série documental do Globoplay em parceria com o departamento de jornalismo da TV Globo, Álvaro desvenda os bastidores da busca pelos imunizantes contra a Covid-19. Disponíveis semanalmente, os cinco episódios mostram a disputa contra o tempo para salvar vidas.

Álvaro Pereira Jr. em coletiva no Instituto Butantan, em São Paulo Foto: Divulgação
Álvaro Pereira Jr. em coletiva no Instituto Butantan, em São Paulo Foto: Divulgação

– A gente queria uma visão cinematográfica sobre a pandemia, sem parecer apenas mais uma matéria de 2h que poderia ser exibida na televisão – conta o repórter, também diretor do projeto.

Clima tenso na Rússia

Álvaro estrutura a roteirização da série em um tripé temático: o prisma científico, a dimensão humana e a guerra geopolítica, no Brasil e no mundo. Sua equipe esteve na Rússia e na Índia, onde conversou com autoridades, representantes de laboratórios e acompanhou os sistemas locais de vacinação.

Nosso ladoSeis profissionais do GLOBO falam dos desafios e fazer jornalismo diário em meio à pandemia

Ao falar sobre a passagem de duas semanas pelo país de Vladimir Putin, em dezembro, Álvaro lembra dos cuidados e atenção redobrada a cada passo que era dado durante as gravações. De perto, ele acompanhou a aprovação em tempo recorde da vacina Sputnik V.

Equipe visita a empresa Bharat em Hyderabad, no Vale do Genoma, na Índia Foto: Divulgação
Equipe visita a empresa Bharat em Hyderabad, no Vale do Genoma, na Índia Foto: Divulgação

– Os postos de saúde liberados para filmagem claramente eram uns circos montados para a imprensa internacional. Então, eles ficavam furiosos quando nos viam fugindo, em busca de locais menos visados – conta o repórter. – Do nada, a gente descobria uma pessoa infiltrada, de olho na gente, se passando por alguém na fila de vacinação.

Já na Índia, nação que abriga o Instituto Serum, maior fabricante de vacinas contra a Covid do mundo, Álvaro e seu time encontraram clima bem menos hostil. Por lá, questionaram a alguns executivos de laboratórios locais, como o Bharat Biotech, sobre a impressão deles diante da gestão da pandemia no Brasil.

Perguntei se sabiam que nosso presidente não acreditava em vacina. Claramente eles têm consciência sobre a figura de Jair Bolsonaro, mas também há a noção de que existem pessoas comprometidas com a saúde pública no governo brasileiro – pondera Álvaro.

RNA é o futuro

Um dos grandes trunfos de “A corrida das vacinas”, sem dúvida, é o farto material de entrevistas com cientistas dos mais diversos laboratórios envolvidos nas pesquisas, como Pfizer, Sinovac, Instituto Sabin e Oxford/Astrazeneca. Também merece destaque o encontro com Barney Graham, um dos responsáveis pela criação da vacina de RNA mensageiro da Moderna.

Álvaro entrevista cientistas do Instituto Gamaleya, na Rússia Foto: Divulgação
Álvaro entrevista cientistas do Instituto Gamaleya, na Rússia Foto: Divulgação

Das conversas com tantos especialistas dedicados não somente à descoberta de imunizantes como também à sua evolução, Álvaro traz uma luz sobre o futuro das pesquisas sobre a Covid.

– A corrida não acabou. Há novas vacinas surgindo, assim como segue em curso a investigação sobre seus efeitos – diz o repórter. – Acredito que a vacina de RNA é o futuro, por não demandar o cultivo do vírus em laboratório, o que torna o processo mais rápido e barato. Nesse aspecto tecnológico, se destacam EUA, Alemanha e Austrália.

Ciência, dinheiro e poder

Se a corrida das vacinas ainda não acabou, tampouco teve fim o trabalho da equipe da série. Álvaro e seu time de cinegrafistas, roteiristas e produtores continuam acompanhando o cotidiano de voluntários brasileiros que tomaram vacinas experimentais, assim como a rotina de cidadãos anônimos que permanecem confinados em casa à espera da chegada do imunizante ao próprio braço.

É o caso de Dona Salua, de 95 anos, que mora a algumas ruas da casa de Álvaro, em São Paulo. A série registra de forma muito delicada a trajetória da personagem pela pandemia, desde os primeiros dias, quando o isolamento ainda era uma novidade, passando por momentos de forte desgaste emocional, até a segunda dose da vacina, recebida por Salua há poucos dias.

Álvaro entrevista Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, em São Paulo Foto: Divulgação
Álvaro entrevista Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, em São Paulo Foto: Divulgação

– Ela mora sozinha, tem um raciocínio rápido, é muito engraçada. Mas jamais entramos na casa dela, por causa do distanciamento – conta o repórter. – Temos personagens de várias idades e classes sociais, esta foi uma prioridade nossa.

Álvaro segue colhendo material jornalístico, uma vez que há a chance de lançamento de mais episódios além dos cinco programados inicialmente. Por enquanto, o repórter lida com as certezas já abstraídas após quatro meses de gravações.

– Os cientistas assumem que não é somente uma corrida contra o vírus, mas também entre laboratórios e  envolve muito dinheiro. Com a soma de uma forte disputa geopolítica, como vemos no Brasil, com Bolsonaro e Dória, e lá fora, entre Rússia, China e Estados Unidos.