Tetracampeão Jorginho ajuda a transformar vidas de crianças em favela do Rio
“Esse projeto é a menina dos meus olhos. Atualmente temos 430 alunos nessa faixa etária e o projeto cuida também de buscar capacitação profissional para os adolescentes. Estamos num momento final de obra e acredito que, em dois anos, vamos poder dar um salto e atender 1.500 educandos”, disse o ex-jogador que conta com a ajuda de patrocínios e da lei de incentivo ao esporte para buscar essas melhorias.
Para Jorginho, o maior objetivo é poder dar formação e perspectiva aos milhares de jovens dessas comunidades. “Trabalhamos com três braços: esporte, educação e cultura. Saem completamente alfabetizados e é importante que eles tenham noção do que representam na sociedade, além de conhecer a própria cultura.”
A pandemia do novo coronavírus acabou alterando a rotina de funcionamento do instituto. O primeiro sinal disso veio com a paralisação das aulas como ação preventiva. Mesmo assim, o projeto não ficou de portas fechadas. “Tivemos reuniões de gestão com pais e mães para prepará-los e ajudar na maneira de administrar o dinheiro e formas de obter outras possíveis fontes de renda.”
Outra forma de ajudar a moradores nesse momento delicado foi aquecer a economia interna. “Nossa ajuda foi um pouco diferente. Eles receberam uma quantia em dinheiro para ajudar na despesa, mas com a obrigatoriedade de gastar tudo no comércio local. Dessa forma o dinheiro gira lá dentro”, explicou.
O momento preocupante por causa da pandemia tem dificultado as ações, mas Jorginho diz que o seu trabalho é reconhecido. “Somos muito ativos junto aos moradores. Somos um braço da comunidade e eles nos respeitam muito.”
Bastante preocupado com a questão da saúde no Brasil, Jorginho sofreu uma perda importante na família com a pandemia. “Foi muito tenso. Meu sogro sofreu um desmaio e teve traumatismo craniano. Ficou internado um mês, teve alta, mas depois passou a ter febre e precisou voltar ao hospital. Infelizmente ele não resistiu e faleceu. Eu contraí o vírus, minha esposa e filhos também. Tomamos todos os cuidados necessários, mas não tinha como não ir ao hospital e acabou acontecendo isso. Eu, na verdade ainda tenho sequelas. Meu olfato ainda não está bom.”
O privilégio dos meninos do complexo de ter um tetracampeão do mundo sempre presente nas atividades e preocupado com as questões sociais da região faz Jorginho voltar no tempo. “Olha, eu fico muito feliz porque netos de amigos meus agora estão tendo aula e fazendo atividades aqui. Isso é muito prazeroso e compensador”, comentou.
A passagem de sucesso do ex-lateral pela Alemanha (defendeu o Bayern de Munique e o Bayer Leverkusen) também rendem frutos para o seu projeto. “Minha ligação é muito forte com eles (alemães). Tenho uma fundação na Alemanha como forma de captar recursos. O Bayern de Munique é um grande parceiro e já mandou não só material esportivo, mas verba também. Fico muito feliz com isso.”
INFÂNCIA DIFÍCIL E DRAMA FAMILIAR
E foi no meio desse universo, com forte influência da criminalidade e do tráfico de drogas, que Jorginho cresceu. Aos dez anos, ficou órfão de pai, e diante de tantas dificuldades, viu a sua estrutura familiar ruir.
“Logo depois da perda do meu pai, comecei a trabalhar na varrição de um bloco de prédios. Tinha um varandão e muitas entradas e varrer o local era uma maneira de levar um dinheiro para casa. Mas teve o problema com meus dois irmãos. Um se tornou usuário de drogas e o outro alcoólatra. A gente sofreu muito com isso. Graças a Deus hoje eles estão recuperados e levam uma vida normal. Mas foi um período muito complicado”, conta Jorginho.
Na adolescência, ele conta que várias vezes foi convidado a fazer coisas erradas por integrantes do tráfico, mas o ingresso nas categorias de base do América acabou mudando o seu rumo. “Passei a focar no futebol. Mas tenho de agradecer a uma pessoa em especial. O Antonio Carlos da Silva Adão, o Catanha. Ele cuidava de um campo que tinha no bairro e eu o ajudava na manutenção. Ele me deu muitos conselhos e foi meio que um pai para mim. Ensinou valores e que eu não seguisse os caminhos dos meus irmãos, que naquela época, estavam completamente perdidos.”
Graças ao futebol e a carreira de sucesso, Jorginho pôde retribuir às crianças da comunidade oportunidades que nunca teve. E isso tudo devido ao futebol. “Comecei a me preparar para isso quando estive no Japão (defendeu o Kashima Antlers entre 1995 e 1998). Depois retornei ao Brasil joguei mais um pouco e iniciei a carreira de treinador.”
DO BANCO DE RESERVAS À SELEÇÃO
Campeão carioca à frente do Vasco em 2016, Jorginho teve, na verdade, seu grande momento à beira do campo quando foi auxiliar de Dunga no comando da seleção brasileira que esteve na Copa do Mundo de 2010. Mas se engana quem pensa que, nos tempos de seleção, os dois eram amigos inseparáveis.
“Foi uma surpresa para mim. Eu estava em Campinas, na casa do Silas (ex-jogador da seleção brasileira e amigo de Jorginho), quando o Dunga entrou em contato comigo. Tínhamos jogados juntos várias vezes na seleção, inclusive em duas Copas do Mundo, mas nunca fomos muito próximos. Quando eu perguntei a ele a razão do convite, ele disse: nessas horas de trabalho, não tem essa de amigo íntimo. Primeiro, tem de ser alguém de confiança, que conheça, e que esteja fazendo um bom trabalho”.
Daquele período, ele fez um balanço positivo e lamentou apenas a derrota para Holanda por 2 a 1 nas quartas de final, que acabou eliminando o Brasil. “Ganhamos Copa América, Copa das Confederações, primeiro lugar nas Eliminatórias ganhando de 3 a 1 da Argentina lá dentro. Era um time que tinha a cara do Dunga”.
Seu último trabalho como treinador foi no Coritiba. Em 2019, ele levou o time paranaense de volta à elite num belo trabalho. Atualmente sem clube, ele aguarda novas propostas. Ele fez uma participação como comentarista no SBT recentemente, mas seu objetivo é seguir como treinador.