Em vídeo, Beira-Mar relata greve de fome e diz ter sofrido tortura na prisão

ANA LUIZA DE ALBUQUERQUE

FOLHA DE S. PAULO 
RIO DE JANEIRO – O traficante Luiz Fernando da Costa, conhecido como Fernandinho Beira-Mar, apontado como uma das maiores lideranças do Comando Vermelho, narrou em audiência judicial que tem tido seus direitos cerceados no presídio federal de Campo Grande (MS). Ele afirmou que tem tido dificuldades em receber atendimento jurídico e médico e que tem enfrentado problemas psicológicos.

Beira-Mar também narrou que, para conseguir encontrar seus advogados, ficou em greve de fome por 19 dias. Ele disse que foi alvo de xingamentos e humilhações de um funcionário do presídio e que foi mantido em uma cela isolada por seis meses ao chegar ao local.

A audiência ocorreu em agosto com o juiz-corregedor federal Dalton Igor Kita Conrado. A gravação foi revelada pelo UOL e depois obtida pela Folha.

O traficante relatou também que seus advogados não podem deixar documentos no presídio, tendo que enviá-los pelos Correios. Às vezes, segundo ele, acabam extraviados. “Às vezes mandamos documentos para as autoridades e não saem da unidade”, disse.

Preso desde abril de 2001, quando foi capturado na selva colombiana por tropas do Exército local, Beira-Mar ganhou notoriedade por organizar sua própria rede de distribuição de armas e drogas a partir de conexões com traficantes da América Latina. Ele acumula penas que somam quase 350 anos de prisão e é acusado de comandar o crime de dentro da cadeia.

Durante a audiência, Beira-Mar disse que nunca viu acontecer o que acontece na penitenciária de Campo Grande. “Quando cheguei aqui, a comida era estragada, vários presos comunicaram ao senhor. A empresa era irregular, funcionava em um endereço diferente do que o do contrato, que vinha sendo renovado constantemente”, afirmou.

O traficante também reclamou de um funcionário que xinga os detentos e disse ter sido humilhado logo após terminar a greve de fome. “Um dia após sair, estava no setor da enfermaria, sendo atendido pela psicóloga e duas assistentes sociais. Ele me humilhou, exigiu que eu abaixasse a cabeça, eu deitado numa cama sem conseguir andar. Gritou comigo, fez vários tipos de procedimento”, afirmou.

Quando chegou ao presídio, Beira-Mar narra ter sido mantido isolado em uma cela por quase seis meses. “Entendo isso como uma forma de tortura. Estava numa cela escura, sem condição de leitura. (…) A direção responde ‘O preso não tem que escolher’. Eu não quero escolher, quero meu direito de ter um ambiente salubre para poder ler, estudar”, disse ao juiz-corregedor.

O traficante também afirmou mais de uma vez que está psicologicamente abalado. Ele disse que não foi atendido seu pedido para ter um tratamento psiquiátrico particular, assim como uma consulta que requisitou com um dermatologista particular –relatou que está “cheio de micose no corpo”.

Beira-Mar criticou, ainda, as revistas pelas quais seus familiares passam na prisão. Disse que seu filho e sua nora enfrentaram um procedimento constrangedor, tendo que tirar toda a roupa e se abaixar em frente a um espelho, de frente e de costas. Segundo ele, sua nora teve que mostrar os lábios vaginais.

Procurada pela Folha, a advogada do traficante, Paloma Gurgel, disse que a audiência com o juiz-corregedor deveria ser praxe, mas que seu cliente vinha tentando há muito tempo ser ouvido. “Só agora em agosto foi, porém não houve nenhum resultado prático, até agora estamos aguardando”, afirmou.

Ela também disse que, em geral, os presos conseguem marcar encontros com seus advogados uma vez por mês, mas que para Beira-Mar isso acontece uma vez a cada dois meses.

O Depen (Departamento Penitenciário Nacional) não respondeu contato da reportagem para esclarecer as alegações de Beira-Mar.

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